quarta-feira, 18 de março de 2015

SUOR FRIO

Lá estava novamente naquela situação que se repetia de tempos em tempos.
O médico com ar grave lendo os resultados do exame tentando não esboçar reação. Eu, sentado na sua frente tinha a mesma sensação de um criminoso esperando a sentença. O consultório era guarnecido por coisas não comuns. Do meu lado esquerdo havia uma estante com várias fotos e livros de medicina. Fotos dele e, imaginava, sua família ou amigos. Uma se destacava. Tirada na neve mostrava um casal sorridente trajando aquelas roupas de descer montanhas nevadas. Era bom ser médico, pensei. Ter uma mulher bonita, até onde o gorro e óculos escuros deixavam ver e uma vida de viagens.
Eu estava separado e as brigas com a ex eram frequentes. Hoje moro num pequeno apartamento com vizinhos barulhentos que, qualquer dia destes, vou encher de balaços. Sempre imagino tiros na cara do meu vizinho de andar quando o time dele faz algum gol em um jogo qualquer. Detesto futebol e não entendo essa paixão por um esporte horrível com jogadores sem nenhuma esportividade e resultados manipulados.
Muitas vezes, de madrugada na sacada minúscula, penso em como chegamos ao ponto de brigarmos por qualquer coisa. Eu e minha ex. Todo aquele amor transformou-se em ódio. Ela até moveu um processo contra mim alegando depressão por conta de meu jeito ogro de ser. Quando soube morri de rir. O problema é que meu advogado diz que ela tem argumentos sólidos. Mais uma na lista dos balaços.
O médico interrompe meu devaneio. Com ar grave diz que os exames não são bons. Nunca entendi aqueles números todos. Exame de sangue, de urina, resultam numa montanha de números. Todos apontando que minha saúde não vai bem. Não é a primeira vez. Até troquei de médico mas, os exames continuam ruins.
Ele começa a prescrever mais exames e remédios enquanto fala que tenho que mudar de vida. Fazer exercícios, parar de beber, não comer comidas gordurosas e por aí vai.
Concordo silenciosamente com tudo. Na saída, marco dia para os exames e retorno.
Já na rua percebo que minha tensão diminuiu. Estava fora do alcance do médico e suas falas tétricas sobre infartos e coisas assim.
O dia estava ensolarado. Olhei para cima e vislumbrei alguns pássaros voando.
A vida é boa, pensei.
E, quer saber? Não vou fazer exames coisa alguma. Muito menos comprar esses remédios com nome esquisito.
Daqui a seis meses consulto outro médico....

Um comentário: