sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Tênis

Uma das primeiras lembranças que tenho deste esporte é ver meu pai sentado no meio da copa assistindo a final do aberto de Mônaco de trocentos e dezesseis anos atrás. Eu assistia um pouco, ia para o quintal, fazia alguma coisa com a minha mãe, pentelhava minha irmã, voltava para a copa e ainda estava lá meu pai com o jogo. Na minha percepção de menino, a partida durou umas 15 horas. No final, avistava-se Jaime Oncins atirado no chão, em deleite por ter vencido. Enquanto isso, meu pai me explicava que aquele tinha sido um jogo antológico e quais eram as razões para que se aplicasse a ele este qualificativo.
A certa altura da vida, ganhei uma raquete. Um primo, por motivos nada agradáveis, já não precisava dela e deu para mim. Eu adorei aquilo! Raquete era um sonho distante e agora estava ali, bem ao alcance das mãos.
Eu estudava em uma escola que tinha quadras que podiam ser usadas à tarde. Só tinha uma questão: eu não conhecia ninguém que jogasse tênis e muito menos tinha dinheiro para pagar aulas. Mas, nesta mesma escola, minha irmã fazia aula de natação. Então, eu aproveitava a carona e ficava com a raquete jogando contra um troço chamado "paredão". Era metade de uma quadra só que, no lugar da rede, existia uma parede com as bordas abauladas para devolver a bola para o meio da quadra. Passava horas ali, acertando a parede, até errar completamente e ter que ir arrastar os joelhos junto das moitas procurando a bolinha. Bolinha de tênis é cara. Naquele tempo, era mais cara ainda.
Numa quinta-feira, lá estava eu heroicamente destroçando a parede quando um senhor parou do lado de fora da quadrinha e ficou me olhando por um tempo. Ele me disse: "você está fazendo tudo errado". Abriu o portãozinho, veio até mim e me mostrou o jeito certo de segurar a raquete, a postura para rebater e tudo o mais.
Depois da preleção, fui convidado para jogar um pouco na quadra de verdade, com dois lados divididos pela rede. Fiquei com medo de passar vergonha, mas era uma proposta irrecusável.
Ao pisar no saibro, meu primeiro pensamento foi o de que não teria forças para mandar a bola para o outro lado. Aquilo era muito grande, mas ficava menor com dois ou três passos a frente, como bem me mostrou aquele senhor.
Batemos bola - poc, pum, pein, pum, poc, pum, pein, e assim por diante, até que eu acertei a rede, como era de se esperar. Neste momento, meu companheiro se declarou cansado, recolheu suas coisas, agradeceu, ouviu meu agradecimento, e foi embora.
Tinha sido fantástico. Voltei para casa entusiasmado, cheio de histórias para contar sobre a minha aventura em uma quadra de tênis de verdade.
Duas vezes por semana, eu voltava lá para jogar. Sempre olhava em volta, buscando aquele senhor que talvez topasse mais uma partidinha como no outro dia. Enquanto isso, as bolas iam até à parede e voltavam - pein, pum, pum, pein, pum, pum, pein...
Só vi meu companheiro - cujo nome nunca soube, mas cujo rosto nunca esqueci - de um único jogo mais uma vez, enquanto ele dirigia seu Fusquinha de volta para casa. Ele acenou para mim.
Em um dia excepcionalmente frio para aquela época do ano, voltei para casa e me deparei com um espelho no elevador. O reflexo escancarava o fato de que dali dois dia eu jogaria de novo com a parede. Não haveria razão para ser diferente: tratava-se de um menino com um raquete velha, cujo encordoamento, todo enferrujado, nunca havia sido trocado e poderia arrebentar a qualquer hora.
Voltei-me, então, para o paredão. Lembrava, às vezes, daquele dia na quadra de verdade - e eram boas lembranças! Mas, com o afastamento, a recordação tomava um sabor diferente e, embora fosse bom pensar naquela troca de bola, já nem parecia que eu tinha estado ali, que era eu rebatendo orgulhoso as bolinhas para o outro lado - pein, pum, poc.
Volta-se à parede e, normalmente, há quatro delas. Com alguma sorte, nenhum espelho estará pendurado. Ao contrário da rede, a opacidade do material não deixa ver que, do outro lado, não tem ninguém.

Um comentário:

  1. Caramba! Nao sabia que voce era vampiro.
    Sempre admirei quem conseguisse ter coordenacao pra jogar qualquer coisa com raquete. Cresci com raquete e bolinhas em abundancia ao alcance da mao, mas pra ser honesta jamais consegui sequer acertar a parede. A coisa mais ridicula que se possa imaginar.

    Agora, jogo de tenis pela TV e de matar qualquer crianca de tedio...

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