quarta-feira, 8 de abril de 2020

Chômage

Fevereiro foi-se junto com o carnaval; gosto de fevereiro, quando o ano ainda é fresco e nos engana com o truque de parecer suficiente para dar conta da vida. Então, passa o feriado, março vem e começa a espremer o tempo entre os dedos numa tentativa desesperada de não deixá-lo fugir.
O mês passou atordoado. Corria para cima e para baixo as escadas do metrô, mesmo sem saber o porquê da pressa ou aonde o trem levaria. 
Semanalmente, um aplicativo no celular informa sobre a evolução do índice de desemprego na França; na estante, livros lidos e não lidos se acumulam, ao lado das inescapáveis tarefas pragmáticas a realizar; outro dia, estava passando em frente ao museu e resolvi entrar: "há tempo", constatei com assombro. 
Com medo de perdê-las, deixo para as horas um orifício menor que o de um funil. Há, todavia, uma porta larga por que poderíamos passar confortáveis, eu e elas. Acumula-las-ia do outro lado do batente questionando, uma a uma, sobre o caminho dali em diante. Só elas saberiam. 
Almocei com um amigo antes que março se esvaísse e, quando fomos ao caixa pagar pela refeição, aproximou-se um homem com uma bolsa caída sobre os ombros, dirigindo-se ao dono do restaurante: 
"Boa tarde. Eu sou eletricista e passo pelos estabelecimentos para perguntar se há necessidade de alguma reparo, algum serviço a ser feito". 
"Hoje, não, obrigado", respondeu o proprietário. Talvez outro dia tivesse. 
O homem saiu. Quis interpelá-lo a respeito de seu cartão de visitas; se não tivesse cartão de visitas, ofereceria ajuda para que conseguisse. Fiquei apenas parado, contudo, observando o eletricista que ia embora, desejando profundamente que encontrasse, sem aflição, as suas horas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário