sábado, 5 de outubro de 2019

MÉDICO POR UM DIA

Senta que lá vem história.
Láááá nos anos setenta cursei Química aqui em Rib's. 
O campus era diversificado com vários cursos e suposto congraçamento entre os estudantes.
Explico: a maioria (e bota maioria nisso) das garotas faziam parte da A.S.M.A. (Agarre Seu Médico Agora).  Neste aspecto a convivência era difícil. Em qualquer festinha ou coisa parecida bastava surgir um estudante de medicina para virar a atração do pedaço. Mesmo que fosse um filhote de cruz credo.
Por ex., o Gafanhoto. Um japonês feio para carai que só andava com o uniforme de atleta da Med. Abrigo verde mamãe cheguei. Como era esquelético o apelido pegou. Até ele era cercado pelas garotas e ficava olhando para os mortais com aquele ar de superioridade. Tipo "sou sensual, nego".
Os biólogos eram os esquisitos que ficavam sentados na rotatória olhando besouros e quejandos. Os psicólogos eram os malucos que cursavam Psicologia para se curar. Os Químicos os viadinhos e seus vidrinhos coloridos. Os da Odonto torturadores em formação. E, outros.

Pois bem, em 1979 um colega meu estava se engraçando com uma estudante de medicina.
Logo ela ganhou o apelido de pilha fraca por causa da voz que começava alta e diminuía na medida em que a frase terminava.
Como esse nosso colega namorava uma garota que já havia encerrado o curso de Química e voltou para sua cidade natal, a pilha fraca ganhou a antipatia geral.

Um belo dia o caldo entornou de vez. Eu já não morria de amores pelo Reibeto por conta de seu afastamento do ye-ye-ye. Roqueiro ele nunca foi. No restaurante do campus, certa vez, falei mal do dito. Pilha fraca tomou as dores e atacou os Beatles. Disse que não gostava dos cabeludos ingleses.
Virou briga de faca. Entrou a turma do deixa disso e ela encerrou a conversa dizendo que não gostava de mim. Como assim? A gente nem convivia. 

O tempo passou a gente evitava um ao outro, o que significava almoçar com galera diferente. 
Naquele ano o prédio novo do Hospital das Clínicas da Usp, o já famoso FMRP-USP estava funcionando meia boca. Ainda em obras mas, com algumas alas em ação.
Por ironia estávamos almoçando todos juntos e eu comentei que havia um puta aparelho de tomografia sendo instalado no prédio. Se não me engano o primeiro da Ámerica do Sul. Disse que gostaria de ver o bichão. 
Pois do nada a pilha fraca me convidou a ir ver o aparelho. Como assim?
Acho que ela se arrependeu de não gostar de um cara tão legal quanto eu.
Só havia um problema. Era ambiente restrito por causa das obras e só acessível para médicos e estudantes de medicina. E agora José?

Sem problemas. Marcamos hora na frente do prédio e ela me forneceu um avental de algum colega dela. Virei o Dr. Qualquer Coisa, quintanista de medicina. Mó chic.
Ao adentrar ao prédio ela me avisou para não falar nada com ninguém e aceitar amostras grátis que os representantes da indústria farmacêutica iriam me oferecer. 
Sim, meninos. Desde aquela época e num hospital que nem estava operando (boa essa, hospital operando) a pleno.
Foi muito gozado. Um quintanista barbudo e cabeludo, tipo bicho grilo como diziam, entrando solenemente como se fosse um Jesus Cristo médico.
Mesmo assim fui cercado e ganhei vários remédios. A pilha fraca foi me arrastando e conseguimos escapar para o andar onde repousava o aparelho.
Um túnel enorme de aço escovado. Não era possível chegar perto por causa das obras de instalação. Mas, valeu. Pilha fraca ganhou minha admiração pela ousadia.
Na saída mais remédios. 
Ela ficou com todos menos as cartelas de Cibalena.

Dona Alzira adorava Cibalena. Resolvia tudo. Enxaqueca? Cibalena. Diarreia? Cibalena. Prisão de ventre? Cibalena. Falta de dinheiro? Cibalena. Notas baixas? Cibalena. Quebrou o carro? Cibalena.

Hoje eu lembro desse dia e fico feliz por ter resolvido a questão com a pilha fraca. Ficamos mais próximos apesar dos pesares. Sei que ela é uma médica respeitável em sampa. E, espero que tenha frequentado uma fono para resolver o problema da voz. 


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