segunda-feira, 15 de julho de 2013

Compostura

Com peso, potência e técnica equivalentes, ganha quem tem a cabeça no lugar.

Era a segunda bateria do dia e largar em primeiro era um bom sinal para a corrida. Aquela rápida olhada em volta, um breve aceno entre companheiros de equipe para comunicar as qualidades do kart e, em breve partiríamos. 
A largada foi confortável, nem dei os tradicionais "pulinhos" para dar impulso. Tinha certeza de que sairia da primeira chincane liderando o pelotão. E foi assim. 
Aproximando-nos, pela primeira vez, do cotovelo, não via ninguém. Por causa da proximidade entre os karts, achei por bem fazer uma tomada mais por dentro, sem tangenciar completamente. Daquele modo, mostraria para quem viesse atrás - especificamente, ao meu amigo\companheiro de equipe - de que estava ali e queria continuar ali. Na freada, julguei estar confortável: era a primeira volta, ninguém largara melhor que eu e ninguém estaria disposto a arriscar tudo ali no cotovelo, especialmente tendo posicionado o kart na parte interna da pista. 
Foi uma grande surpresa avistá-lo por dentro na tomada, freando profundamente e perdendo levemente a tomada. Minha única reação foi frear ainda mais, buscando sair mais "justo" do grampo, tracionar melhor  e devolver a ultrapassagem na subida. 
O plano, elaborado em uma fração de segundo, foi por água abaixo quando senti a traseira escapando sem volta. Não sei bem o que houve - tive quase certeza de ter sido tocado, mas é possível que, no susto, tenha pisado demais nos freios ainda frios, tenha travado as rodas traseiras e virado sozinho. Tomei batidas de tudo quanto foi lado, agradeci por estar inteiro, endireitei o kart na pista e fiz a subida sem avistar ninguém a frente, não em razão de liderar, mas por estar em último, muito atrás do penúltimo. 
Enquanto o kart subia pela reta, eu calculava a distância para os demais e se valia a pena persegui-los ou parar no boxe para assistir o resto da corrida tomando um Gatorade. A frustração era imensa. Mais, perder a primeira disputa de freada acaba com a confiança.
Continuei, afinal, cada 20 minutos na pista custa uma pequena fortuna - e eles não dão desconto pelo abandono. No fim das contas, fiz uma prova muito boa, chegando em segundo e descontando boa parte da vantagem conquistada pelo meu companheiro de equipe após a rodada. 
Ótimo resultado final para nós! Uma dobradinha no território em que só correm caras com trinta quilos a menos que nós e que treinam semanalmente - luxo que nós não temos. Mas, ficou uma pontinha de decepção por não saber o que aconteceria sem a rodada. 

_ Você não me passaria de jeito nenhum, sentenciou meu amigo. 

O tom seco da afirmação foi tão surpreendente quanto a ultrapassagem naquela primeira volta. Ali, estava contida uma lição difícil de aprender: meu amigo - meu melhor amigo - faria tudo o que fosse preciso me vencer. Enquanto estou sentado aqui, escrevendo, julgo que estou em boa forma em termos de pilotagem. Mas, na pista, em determinada situação em que as coisas não estiverem saindo bem para mim, não vou me sentir desta mesma forma e, claro, não vou conseguir ir para frente - eis aí o aspecto mais difícil de qualquer competição. 
Pensei em inúmeras explicações para nossa diferença de abordagem, passando, como não poderia deixar de ser, pela origem nórdica dele, a minha origem latina. Mas o fato é que ter a cabeça no lugar determina se se vai perder ou vencer. É assim na pista, talvez seja assim na vida. A ideia, no fundo, é muito simples: manter a cabeça no lugar e não deixar o estresse nos desconectar de nossa sensibilidade. Endurecer, e endurecer na medida e na hora certas é um desafio para vida e para a pista.  
E se alguém tiver uma dose de autoconfiança para emprestar, encaminhe para a sede paulistana de nosso blog. 

3 comentários:

  1. Ra! Senna não era nórdico. Mas, colocou o mundo inteiro a fitar o traseiro de seu talento. Manda vê filhão.

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  2. Ra! Senna não era nórdico. Mas, colocou o mundo inteiro a fitar o traseiro de seu talento. Manda vê filhão.

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  3. Preciso parar urgente de ler essas metaforas automobisicas. Outro dia acordei novamente com o som da minha propria gargalhada.

    Mas o nordico mencionou o seu exito. Omitindo a sessao de batidas e freadas. Ou ele acha que nao entendo nada do assunto, ou houve inversao da importancia dos fatos.

    E em nome da galera feminina reitero o apelo a que se poste "menas" automobilismo e mais gala de cinema: os dialogos do Pequeno Principe foram sucesso total.

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