quinta-feira, 11 de maio de 2017

Rubem Fonseca mudou meu modo de ver a literatura e a vida

Faz algumas semanas, foi lançada ao mercado a mais recente obra de Rubem Fonseca, intitulada "Calibre 22". Para brindar a chegada da coletânea de contos, a imprensa especializada publicou as suas críticas e uma delas chamou-me muito a atenção, a começar pelo título: "Rubem Fonseca parece encher obra com esboços tirados do lixo". Leia lá, depois me conta. 
Não conheço o crítico em questão e até fiquei curioso por ler alguma obra de ficção de sua autoria, mas preferi, no momento, ir atrás de adquirir o Calibre 22. Depois visitar diversas livrarias que não haviam recebido o título, uma senhorita teve a bondade de fazer vir do Rio de Janeiro um exemplar.
Li e gostei. Os contos estão longe de serem esboços tirados do lixo ou espelharem "gritante descaso autoral". Sim, muitos deles são constrangedores; alguns, podemos dizer, são efetivamente chatos. Deliberadamente chatos. Se Rubem Fonseca retrata a brutalidade do ambiente urbano, retrata também a sua falta de tempero, a sua mediocridade, a sua mesquinhez e, principalmente, os seus falseamentos; a literatura de Calibre 22 decorre precisamente destes elementos.  
O conto inaugural dá o tom do plano do livro. Trata-se de um sujeito endinheirado que finge ser psicanalista e, mesmo sem ter habilitação, torna-se "um dos melhores e mais caros da cidade". Há, também, a moça que estudou enfermagem, enojou-se ao ajudar pessoas idosas e, então, passa a prostituir-se tendo predominantemente idosos como clientes; a pretendente que, ao ficar nua, revela ser do sexo masculino. As histórias, todas em primeira pessoa, relatam as artimanhas, mais ou menos eficientes, que se encontram para justificar-se e encobrir-se a si próprio; relatam a mesmice e a chatice do cotidiano; passam o "problema do crer-ou-não-crer adiante".
Pode-se gostar ou não gostar, como de todos os outros livros do autor. Pode-se apelar para o clichê de que, "ah, o Rubem Fonseca, coitado, já foi tão bom e, agora, olha só que porcaria", como acontece todas as vezes que ele lança um livro novo. Mas não dá para dizer que o autor perdeu a fé na literatura; mais verossímil que tenha perdido a fé em todo o resto, pois, completando hoje 92 anos de vida, gozando da reputação de escritor consagrado, poderia, simplesmente, rodar por aí - como fazem muitos menininhos mimados - fazendo palestras e ganhando dinheiro para dizer obviedades sobre si mesmo; ou, quem sabe, poderia sentar-se em uma cadeira de praia no Leblon, tomando um sem número de caipirinhas; aos 92 anos, ele se importa tanto com a literatura que a continua. Parabéns. 

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