domingo, 22 de fevereiro de 2015

Entre carro e cabeça

Após conquistar quatro títulos mundiais em sequência entre 2010 e 2013, o Sebastian Vettel de 2014 teve atuações apagadas e ficou muito longe da performance que o colocou entre os maiores campões da história da Fórmula-1. Além de deixar de ter nas mãos um carro verdadeiramente vencedor, foi surrado por seu companheiro de equipe, o australiano Daniel Ricciardo, que venceu três corridas ao longo do ano, terminando a temporada com larga vantagem sobre Vettel na pontuação.
O campeonato ruim fez algumas dúvidas surgirem sobre a própria capacidade de Sebastian como piloto. Os grandes campeões não passaram por isso; pior, Fernando Alonso, apontado por boa parte da mídia especializada como o melhor piloto do atual grid, não teria passado por sufoco deste tamanho com qualquer companheiro de equipe ao longo de sua carreira. A baixa performance de Vettel associada ao massacre de Alfonso sobre seu companheiro de equipe Kimi Raikkönen fomentou a ideia, feita divulgar pelo próprio Alonsito e seus fanzitos, de que o espanhol é um injustiçado e só não tem mais títulos na F-1 pela incompetência ferrarista. 
Antes de tudo, comparações entre Vettel e Alonso, neste momento, ainda tendem a ser imperfeitas. São pilotos em momentos muito diferentes na carreira, já que Vettel é significativamente mais jovem e ainda em ascensão, enquanto Alonso é mais experiente e já há alguns anos está com pressa para achar um bom assento que lhe garanta a volta às vitórias antes da aposentadoria. Em suma, Alonso é experiente sem estar ultrapassado, enquanto Vettel ainda não atingiu a plena maturidade enquanto piloto. 
No entanto, pode-se cogitar uma comparação interessante se olharmos os momentos em que cessaram as sequências de títulos do espanhol e do alemão. Em 2007, após ser campeão em 2005 e 2006 pela Renault, Alonso penou com seu jovem companheiro de equipe Lewis Hamilton na McLaren. Por sua vez, Vettel apanhou feio de Ricciardo após o tetra. Acredito que a semelhança entre as duas situações está na menor experiência do companheiro que antagonizou um campeão, sofrendo menor grau de pressão, justamente em razão da falta de compromisso com os resultados. 
No caso de Vettel, o que chama atenção é o abismo que se abriu entre ele e Ricciardo -  o que não aconteceu na disputa acirrada entre Hamilton e Alonso. Parecia que o australiano havia incorporado o melhor de Vettel em sua própria pilotagem: o controle perfeito do ritmo de corrida e do desgaste de pneus para levar o carro ao máximo de sua eficiência. Ricciardo fez com naturalidade o que Vettel lutou para não conseguir. A rodada no GP da Hungria, com pneus desgastados, enquanto Ricciardo rumava para a vitória, foi um momento significativo da diferença entre os dois companheiros.
Seria Vettel, então, uma fraude? Há, por aí, uma série de opiniões a este respeito e todas valem o quanto custam - inclusive a minha: absolutamente nada. Hoje, ainda considero Vettel um dos melhores pilotos que vi correr. É impossível, entretanto, saber como o resto de sua carreira será. Daqui alguns anos, suas belíssimas atuações podem ser lembradas, apenas, como resultado de um projeto magnífico levado a efeito por Adrian Newey e sua equipe. 
Não creio, reitero, que Vettel seja uma farsa automobilística. Para tentar explica seu péssimo 2014, acho significativa a declaração de Christian Horner informando que Vettel considerara encerrar sua carreira em razão da insatisfação com os rumos assumidos pela F-1 neste último ano. Se o sujeito está tão infeliz com seu ambiente de trabalho, é normal que seu rendimento caia, não importa qual a atividade realizada. Digo por mim, com as minhas recorrentes "crises de meio de semestre", quando penso em jogar tudo para o alto e procurar um emprego que me permita jantar antes das 23h. 
Aventou-se, também, o cansaço em razão da disputa do título por cinco anos em sequência - lembrando, é claro, do vice-campeonato em 2009.  Cansaço pode ser um fator, é óbvio, mas só afeta, efetivamente, o piloto, se sua cabeça não está apta a responder adequadamente. 
Agora, o que não se duvida ter sido um fator crucial na queda de rendimento de Sebastian foi a drástica mudança de regulamento que sofreu a categoria de 2013 para 2014. Modelou-se um conjunto de regras técnicas anti-Red Bull e, consequentemente, anti-Sebastian Vettel. Este é um movimento normal na F-1 quando se assiste um longo domínio de um time: chacoalhemos as possibilidades técnicas para nos livrarmos de tudo o que o time em questão tem de vantagem. É feio, mas é mais feio ainda quando acontece no meio do campeonato, como a proibição dos amortecedores de massa em 2006. 
Eu ainda acrescentaria um fator, mas apenas a título de especulação. Fazer o que Vettel fazia até 2013 e o que Ricciardo passou a fazer em 2014, demanda uma perfeita integração piloto-equipe. O controle do ritmo de corrida e do desgaste do equipamento, mencionado alguns parágrafos acima, exigem um fluxo de informações com pouco ruído. Apesar de se dizer que apenas no GP do Japão é que Vettel contou à Red Bull que a deixaria pela Ferrari, já não haveria um pré-contrato ou algo que o valha circulando que teria feito a equipe anglo-austríaca "frear" as informações que chegariam até Vettel? 
Fossem quais fossem as razões para a queda do grande campeão, Vettel recomeça sua carreira vestindo vermelho daqui a poucos dias. Apenas o retorno das velhas velocidade e consistência dissipará a negra nuvem de dúvidas que hoje paira sobre ele. Torço para que o tempo abra, afinal, tem que sobrar um herói. 

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