domingo, 1 de abril de 2012

VEIA VÉIA

Raramente damos importância a esta espécie de casulo que nos aprisiona. Em verdade ele é o dono de nosso destino. O corpo.
Pensamos que estamos no comando de nossas ações determinando o rumo de nossas vidas. Vai nessa.
Dizia uma professora na faculdade de Direito que nascemos com o destino traçado. Todo ele contido no Código Civil.
Risos amarelos à parte só damos atenção ao nosso casulo quando ele nos informa quem está no comando.
No meu caso, e ressaca não vale, a primeira vez em que levei um bom susto foi na minha primeira cólica renal.
Já tinha visto o “seu” Homero rolar no chão de dor devido a esta desagradável situação e fiquei assustado com o terremoto que se abate sobre o corpo humano.
Em uma dessas crises, já no hospital, desmaiei de dor. Enquanto aguardava que meu corpo se reconciliasse comigo pensava em quanto somos frágeis e dependentes de algo que não conhecemos a fundo.
Sim, podemos fazer quantos exames existirem no mundo, mas não saberemos o que realmente se passa nessa massa orgânica cheia de carbonos nas mais variadas formas, água, íons, cátions e (êpa!) ligações elétricas. Quando fiz a facu de Química lááá nos anos setenta do século passado saía para espairecer tentando manter o copo vazio de cerveja enquanto alguém o enchia o tempo todo. Muitas vezes eu mesmo enchia, mas não vem ao caso.
Numa dessas saídas lembro de uma conversa com um estudante de medicina (aliás, a relação estudantes “normais” versus estudantes de medicina merece um post).
Ele era peruano e diferente dos outros “mediquinhos” porque acessível. Enfim, as conversas eram, muitas vezes, agradáveis quando tratavam de doenças complicadas, atendimentos de emergência, exames ginecológicos e coisas do gênero.
Uma vez ele disse que havia um estudo que apontava como um problema elétrico muitas mortes classificadas como colapso cardíaco. Sim, algo provocava curto circuito e devido a isto o coração parava. Não por entupimento das artérias ou algo assim. E, um curto circuito não tem como ser avaliado.
Acredito que problemas complexos fazem com que nosso corpo seja ainda mais misterioso do que é.
E, pensamentos sobre esta complexidade numa cama de hospital te deixam fragilizado e entregue à própria sorte. Não há nada que possamos fazer. Muitas vezes nem aquele ser de branco sabe o que se passa. Nos entopem de remédios. Se der certo tudo bem. Se não, o paciente não seguiu as instruções. Manter-se vivo, por exemplo.
Costumo comparar o corpo humano ao automóvel. Se a gente levar o monte de lata ao mecânico este vai descobrir vários defeitos. Existentes ou não.
Se formos ao médico este vai descobrir vários defeitos. Existentes ou não.
Em algumas situações trocam-se peças. Em outras uma peça é tirada sem reposição.
Lembro que “seu” Homero tinha uma famosa Brasília branca com duplo carburador. Numa ida ao mecânico este simplesmente desabilitou um dos carburadores jogando fora o que estava em pior estado. Tudo porque meu pai reclamou do consumo de combustível.
Então, numa ida ao médico este decide que algumas veias em nosso corpo estão atrapalhando o bom andamento do sangue. Então, arranca as ditas.
Foi o que aconteceu comigo. Um médico de excelente astral, diga-se de passagem, concluiu que algumas veias em ambas as pernas não ajudavam em nada meu amado corpinho. Então, cá estou eu, mezzo deitado, mezzo sentado com as pernas para cima em recuperação.
Agora, imaginem aqueles filmes que mostram cenas extras enquanto passam os créditos.
Vamos lá.
Fui em consulta ao anestesista da equipe.
Rapagão simpático que foi logo perguntando:
“Então, o senhor vai operar a coluna?”
Eu já imaginando estar num filme louco em que sou outra pessoa.
“Como?”
E o médico:
“Ah! Paciente errado.”
Na mesma consulta.
“Qual o procedimento que o senhor vai sofrer”?
Eu:
“não sei.”
“Que remédios o senhor toma?”
“Vixê! Não lembro os nomes.”
Aqui o grande mico apareceu. Tive que ligar em casa para alguém ler o nome dos remédios na caixinha. Só estava a nossa secretária. Ela tentando ler, eu tentando entender e o médico tentando decifrar. Meninos, que vergonha!
Agora eu na sala de cirurgia. O médico é daqueles que falam sem parar. Eu fui colocado num estado de torpor. Não sabia se estava lá ou cá. Não sabia se aqueles comentários depreciativos em relação à minhas veias eram reais ou não. De qualquer maneira aquela falação era um convite. Resolvi entrar na conversa. Só lembro que alguém de branco (dãã) olhou para mim. Deve ter dado uma cacetada em minha cabeça. Só acordei no quarto.

Um comentário:

  1. Caramba! Essa teoria sobre os medicos e muito boa. E eu achava que fosse minha e original...

    De qualquer forma, nao sei se o Renato ja te contou, eu meio que trabalho com um Homem de branco muito bom. De hoje em diante passa o doutor-Luiz-pai-do-Renatao a ser objeto em minhas conversas com Ele =D

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