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segunda-feira, 8 de maio de 2017

CAÇULINHA 171

Senta que lá vem história.
Como sabem nos idos 1970 muitos professores do curso de Química da USP em Rib's eram estrangeiros.
Como em todo ensino, época, curso e etc, existem os professores legais e os malas sem rodinhas. Como professor legal não aqueles que dão nota à toa mas, os que sabem ensinar o caminho por entre as pedras pontiagudas. 
Tínhamos naquela época várias malas e, algumas estrangeiras.
Um deles faz parte do time que marca prova no mesmo dia (e depois) que outro professor marcou. E, não muda só por pirraça.
Esse é daqueles que escolhiam alguns alunos (normalmente mauricinhos "cu de ferro") como modelos a serem seguidos. Ouvi, em certa ocasião, um professor dizer que ninguém tiraria nota maior que "eles". 
Dá para imaginar o tipo de babaca com quem lidávamos. Eu sofria de um agravante. Era tido como da "esquerda festiva". Não sei o que isso quer dizer. Nunca fui de esquerda. Mas, festivo sim.
Naquele tempo quem não era a favor da ditadura era comunista. Bem simples. Certa vez fui discutir nota com um desses babacas que, na falta de argumento pela nota baixa, me acusou de ser da "esquerda festiva". 
Um desses malas normalmente se deslocava para lá e para cá de moto. Era, seguramente, um dos únicos motociclistas de Rib's a usar capacete. Foi o que o salvou.
Quando este sujeito corrigia meus trabalhos visivelmente tentava baixar as notas pelo que "eu era".
Num fim de ano bateu uma clarividência e eu fui bem numa prova. Ele ficou embasbacado e sabia que eu não tinha colado de ninguém porque sempre sentava isolado nas provas. Mesmo assim eu precisaria, para alcançar a média, fazer uma prova substitutiva. 
Aí entra o capacete. Antes de decidir como seria a tal prova o cara caiu da moto, fechado por uma velhinha. Bateu o quengo na guia da calçada, arrebentou a clavícula, sofreu 'centas escoriações. Mas, não morreu.
O capacete partiu (deve ter comprado no Paraguai) deixando marcas no rosto e o olhão inchado.
Todo mundo pensou que ele iria dar nota para os necessitados porque não tinha condições físicas.
Qual o quê. Ressurgiu das cinzas e tal qual um zumbi chamou o pessoal sem-nota-para-passar e marcou sabatina. Não lembro de quantos. Mas, lá estava eu. Marcada a sabatina só restava encontrar vontade em estudar uma matéria que já havia sido exaustivamente escarafunchada.
No interregno marcou-se uma chopada. Para inaugurar o prédio da Química, que por fim iria sair do prédio do IML. Lógico, o prédio não estava pronto mas, motivo para chopada não faltava. 
O professor estropiado confirmou presença. Eu não poderia faltar. E agora? A chopada era na véspera da sabatina.
No dia/noite lá estava eu sorumbático no meio da festa. Todo mundo com copo na mão, o chopp descendo fácil. E, o "tio" de longe mirando este pobre coitado com um olho inchado e o outro brilhando de vontade em me pegar bebendo o líquido precioso. Pensei que se bebesse chopp estaria perdido. Seria uma falta digna de se levar um zero de ofício.
Então, aconteceu uma dessas coisas que só o famoso jeitinho brasileiro pode explicar. Não lembro quem. Mas, meus colegas pegaram uma garrafa de guaraná caçulinha, davam uma disfarçada, enchiam com chopp e entregavam para este pobre escriba. Eu bebia fazendo aquela cara de melancolia que só cachorro abandonado faz.
Certa altura da festa eu estava "feliz" e, para minha surpresa, lá veio o zumbi para meu lado. Disse que estava feliz em saber que eu era responsável o suficiente para não beber em véspera de prova. Eu pensando que ele deveria estar espantado com o número de caçulinhas consumido por mim.
Final da história: no dia seguinte lá estava eu, curtindo uma ressaca brava, e ele doidinho para me pegar no contrapé. Esqueci de dizer que ele fazia uso de uma bengala porque a perna não escapou de uma contusão. Lembro que, depois de uma outra pergunta teórica, lá foi o zumbi trôpego para a lousa.
Na prova que fui bem havia uma questão cabeluda que consumiu uma folha e meia. Ele colocou a questão na lousa e disse que finalmente iria descobrir se eu havia colado. Depois de um tempão destrinchei a pegadinha porque realmente havia resolvido na prova anterior. Sem cola (aliás, diga-se nunca colei).
Ele, visivelmente contrariado, nem deixou que saboreasse a vitória. Me dispensou dizendo que havia alcançado a média.
Fiquei feliz porque consegui conciliar uma bela chopada e o fato de (incrível mas, verdade) impedir que um professor se deleitasse com um fracasso, que seria, de resto, dele também. Afinal, quem é o mestre?

"A laranja."

terça-feira, 25 de abril de 2017

LARANJADA RADIOATIVA

Senta que lá vem história.
De volta aos velhos e etílicos tempos da Química anos 70.
Já disse que os laboratórios do curso ocupavam o prédio (sinistro por si) do IML de Rib's.
Tudo era mambembe, deprimente, velho e com equipamentos obsoletos.
Mas, era o que nos restava.
O prédio (xô vê se acho algo no google "vc está sendo beservado").
Não achei nada. Também, não procurei direito.
Enfim, o prédio (que ainda existe, não sei se ainda do IML) é quadrado com um pátio interno. 
Num dos laboratórios "operavam" dois professores de Inorgânica. Nem sei mais o que significa "inorgânica". 
Como o campus é relativamente distante da cidade, os mestres levavam alguma coisitas para comer durante a tarde. E, pasmem, usavam a mesma geladeira dos componentes químicos que eram armazenados em baixa temperatura, para guardar determinados alimentos.
Pode Arnaldo?
Não pode. Mas, assim era.
Dentre as coisitas os professores levavam havia uma jarra de laranjada. Que, era guardada na tal geladeira.
Vale dizer que o laboratório em tela não era utilizado para fins didáticos. Só para pesquisa. Nós, os pobres alunos, não tínhamos acesso a ele.
Só os dois professores e os funcionários que ajudavam na limpeza dos "bejetos" e até na "fazedura" de determinadas "poções".
Num belo dia um dos mestre percebe que a jarra de laranjada está mais vazia, ou menos cheia, que o normal. Inqueriu seu par que negou ingerir mais laranjada que o combinado.
Então, quem foi?
Tcham, tcham, tcham.
Interrogado o principal funcionário frequentador do laboratório negou de pés e mãos juntas/juntos ser o autor de tamanho crime lesa laranja.
E agora?
O funcionário era o maior suspeito. Pior, a jarra teimava em esvaziar no dia a dia desta vida laboratorial, mesmo após a descoberta da "evaporação".
Que fazer?
Um deles teve uma brilhante ideia.
Um a um os funcionários que frequentavam o laboratório foram chamados.
A eles foi exposta a situação. Alguém estava se deliciando com a jarra de laranjada.
Só que havia um enorme problema. A laranjada era radioativa. Havia uma pesquisa em curso que incluía laranjas radioativas. 
Ou seja, quem estivesse tomando a tal laranjada ficaria broxa para todo o sempre. Fora outros problemas como ficar brilhando no escuro. Imaginem o susto da sogra. Melhor não. Susto do filhinho querido.
Então, o suspeito número um se entregou. Chorando disse que o líquido era muito gostoso e não resistia. Não imaginava o risco que corria (rimou).
E agora?
Que fazer? Vou ficar broxa? Ontem a patroa reclamou....
Aqui entra a brasilidade da situação.
Os  professores, com ar grave, explicaram que já haviam conversado com ele, que negou tudo e que aquilo era inconcebível e etc, etc, etc.
Não acabou aí.
Disseram que ele, o funcionário, deveria tomar uma beberagem com a finalidade de reverter os efeitos da laranjada radioativa.
E, durante um tempo que não me recordo, deram um líquido à base de limão com outras substâncias "ardentes" para reverter a brochura do moço.
Além de, claro, questionamentos sobre o funcionamento do "júnior" que fez a alegria da turma durante várias chopadas.
Por essa e por outras, que, ao comprar suco de laranja leio com toda atenção o rótulo para ter certeza que não é produto do laboratório daqueles dois professores cheios de imaginação.